Fast Shop confessa propinas de R$ 400 milhões a fiscal e faz acordo para pagar multas de R$ 100 mi
Fonte: O Estadão
Por Rayssa Motta e Fausto Macedo
Executivos da Fast Shop, rede especializada no comércio de eletrodomésticos
e eletrônicos, fecharam acordos com o Ministério Público de São Paulo para
encerrar, em relação a eles, as investigações sobre propinas a fiscais da Secretaria
da Fazenda do Estado em troca do favorecimento na liberação de restituições
de ICMS-ST.
Mário Otávio Gomes, diretor estatutário da empresa, que chegou a ser preso
no inquérito da Operação Icaro, deflagrada em 12 de agosto, e os sócios Milton
Kazuyuki Kakumoto e Júlio Atsushi Kakumoto se comprometeram a pagar
multas que somam de R$ 100 milhões. O pagamento será feito em 15 parcelas.
Os executivos assinaram acordos de não persecução penal (ANPP) -
instrumento jurídico em que o réu confessa o crime e se compromete a cumprir
uma série de cláusulas para não responder ao processo criminal. Esse benefício
só é possível para crimes de menor potencial ofensivo, cometidos sem violência,
e com pena máxima prevista de quatro anos.
Os acordos preveem também a criação de um programa de compliance e a
implementação de “prática anticorrupção” na sede da Fast Shop e em todas
suas lojas e centros de distribuição.
‘Oportunidades fiscais’
Como parte do acordo, os executivos detalharam como funcionou o esquema
de corrupção na Secretaria da Fazenda que, segundo os próprios depoimentos,
permitiu a restituição de quase R$ 1,6 bilhão à Fast Shop entre 2021 e 2025.
De acordo com o Ministério Público, eles confessaram “formal e
circunstanciadamente a prática dos fatos delituosos”.
O valor repassado pela empresa ao auditor fiscal Artur Gomes da Silva Neto,
apontado como “cabeça” do esquema, ultrapassa a marca de R$ 400 milhões,
conforme as investigações. O valor foi confirmado pelos executivos. O auditor
está preso.
Júlio narrou que foi o próprio fiscal quem o procurou, no final de 2020 ou no
começo de 2021, oferecendo os “serviços” com a promessa de “oportunidades
fiscais” e de blindar a Fast Shop de fiscalizações e “quaisquer transtornos”.
Milton afirmou que, segundo o fiscal, seria possível estender a cadeia de
restituições a todas as fases de produção, ”até a produção de minério".
‘Empresas parceiras’
De acordo com os depoimentos, com o tempo, Artur teria passado a
intermediar o contato com “empresas parceiras” interessadas na compra dos
créditos de ICMS.
Funcionário da Fast Shop por mais de 30 anos, Mário é o responsável pelos
assuntos fiscais da empresa. Era ele quem lidava com o auditor no dia a dia. O
diretor afirmou em seu depoimento que sempre providenciou a documentação
solicitada por Artur e que, algumas vezes, o próprio fiscal consultava os dados
nos sistemas da Secretaria da Fazenda por meio do certificado digital da Fast
Shop.
Mário também implicou em seu depoimento o contador Agnaldo de Campos e
o lobista Celso Éder Gonzaga de Araújo, suspeito de lavar dinheiro do
esquema. Os dois teriam sido apresentados por Artur para “trabalhos de
recuperação de impostos na área federal”. Segundo o diretor da Fast Shop, a
empresa fechou contratos com Agnaldo e Celso que previam uma comissão de
30% sobre os ressarcimentos que conseguissem.
O Ministério Público avalia compartilhar uma cópia da Operação Ícacaro com
a Receita Federal para verificar se o esquema se estendeu para impostos federais.